"Nzambi a tu bane nguzu um kukaiela"

sábado, 7 de abril de 2012

A agressão europeia na Libéria e na Etiópia 1880-1914 (Monday B. Akpan)

Negus Menelik II (1844-1913)

"Quando assinei esse tratado de amizade com a Itália, declarei que, como éramos amigos, nossos assuntos na Europa poderiam ser resolvidos com a ajuda do rei da Itália; mas disse isso para guardar nossos segredos e preservar nosso bom entendimento; não celebrei tratado algum que a isso me obrigue e, hoje em dia, não sou homem que o aceite. Vossa Majestade compreenderá perfeitamente que um Estado soberano não precisa de outro Estado para dirigir os seus negócios" (Menelik II, 27/09/1890)

... A 2 de maio de 1889, menos de dois anos após a morte de Yohannes (Imperador da Etiópia), um tratado de paz e de amizade marcava o apogeu das boas relações entre Menelik e a Itália. Foi assinado na aldeia etíope de Wuchale.

Negus Yohannes IV (1837-1889)

Yohannes IV e seu filho

Selo do Imperador Yohannes

O tratado de Wuchale (Ucciale, em italiano), que devia marcar o ponto decisivo nas relações entre dois países, continha dispositivos favoráveis a ambas as partes. Menelik reconhecia a soberania da Itália sobre a maior parte do planalto da Eritreia, abrangendo Asmara, e a Itália reconhecia Menelik como imperador - tratava-se do primeiro país a fazê-lo -, prometendo-lhe o direito de importar, através da Eritreia, armas e munições. O mais importante trecho do tratado, no entanto, o artigo 17, se prestaria a contestações. Havia duas versões do tratado, uma em amárico e outra em italiano, e o artigo 17 apresentava sentido diferente em cada versão. De acordo com o texto em amárico, a Etiópia poderia recorrer à intermediação das autoridades italianas se quisesse estabelecer relações com outros países; o texto italiano tornava esse recurso obrigatório.

Ras Makonnen (1852-1906)
Governador da Província Harar

Ras Tafari Makonnen (1892-1975) 

Negus Haile Selassie, criança: 
Filho de Ras Makonnen


Embora, de acordo com a versão italiana, a Itália pretendesse estabelecer um protetorado na Etiópia, as relações entre os dois países permaneceram boas por vários meses. Em julho de 1889, Menelik enviou à Itália seu primo, o Ras Makonnen, governador de Harar, para discutir a aplicação do tratado. Enquanto isso, sob o comando do general Baldissera, os italianos continuavam seu avanço pelo planalto da Eritreia, já pondo em prática os termos do tratado. Em 2 de agosto, Baldissera proclamou a ocupação de Asmara.
No dia 1º de outubro, em Roma, Makonen assinou um acordo adicional: a Itália reconhecia mais uma vez o título de imperador de Menelik, enquanto este reconhecia a soberania italiana sobre a colônia do Mar Vermelho, nos limites das fronteiras que já possuía. Além disso, a Itália emprestaria à Etiópia 4 milhões de liras.
Quase imediatamente, porém, todo o projeto de cooperação teve de ser abandonado, pois no dia 11 de outubro o ministro das Relações Exteriores da Itália, Crispi, declarou que, "conforme o artigo 34 do tratado perpétuo [...] S. M. o rei da Etiópia aceita os bons ofícios de S. M. o rei da Itália para tudo quanto diz respeito às relações da Etiópia com outras potências ou governos".
Embora a declaração de Crispi estivesse formulada em termos indiretos, era inequívoco que a Itália afirmava seu protetorado sobre a Etiópia. Como era de esperar, a pretensão italiana logo foi reconhecida pelas potências europeias: daí por diante, as cartas geográficas impressas na Europa passaram a designar a Etiópia pelo nome de "Abissínia italiana". Quando, a 3 de novembro de 1889, Menelik anunciou às potências europeias que seria coroado imperador, deram-lhe a mortificante resposta de que, sendo a Etiópia um protetorado, não podiam estabelecer relações com ela a não ser por intermédio da Itália. Em 24 de março e 14 de abril de 1891, e em 5 de maio de 1894, o Reino Unido assinou com a Itália três protocolos que fixaram as fronteiras do pretenso protetorado com as colônias inglesas.
Enquanto isso, para apoio de suas pretensões, os italianos avançaram pelo norte da Etiópia, da Eritreia ao Tigre. Ultrapassaram os limites anteriormente convencionados, cruzaram o rio Mareb e ocuparam a cidade de Adowa em janeiro de 1890. Comunicaram depois ao Ras Mangacha, governador da província de Tigre e filho de Yohannes, que ocupariam Adowa enquanto Menelik não aceitasse a interpretação por eles dada ao tratado de Wuchale.

Ras Mangacha Yohannes (1868-1906)
Governador da Província de Tigre
Filho de Yohannes IV

Menelik recusou-se a ceder. Em 27 de setembro de 1890, escreveu ao rei Humberto I da Itália haver descoberto que as duas versões do artigo 17 possuíam sentidos diferentes.
Decidido a não depender mais do empréstimo da Itália, Menelik começou, então a resgatá-lo. As relações entre os dois países estavam num beco sem saída. No decorrer dos debates que se seguiram , o representante da Itália, Antonelli, informou a Menelik que "a Itália não podia, sem quebra de sua dignidade, informar às outras potências que se havia enganado a propósito do artigo 17".


Libéria e Etiópia, 1880-1914: a sobrevivência de dois Estados africanos (Monday B. Akpan)

BOAHEN, A. Adu. (Coord.) 
"História Geral da Africa Vol. VII: A Africa sob dominação colonial, 1880-1935"  
São Paulo: Atica/UNESCO, 1991. p. 281 - 283.

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